terça-feira, 25 de maio de 2010

O espelho me disse

Acho que todo mundo já percebeu que de uns anos para cá foi instituído quase que por lei que para ser feliz é necessário ter um corpo perfeito, um rosto invejável, um cabelo fashion e uma dieta alimentar de deixar qualquer um frustrado. Agora, muito mais do que uma boa saúde é necessário ter uma boa aparência. Do contrário o indivíduo é considerado fora dos conceitos da normalidade mundial.

Revistas, jornais e os diversos canais televisivos trabalham o tempo todo com o conceito de beleza + beleza = felicidade. Ficou mais do que provado de que ser bonito é ser feliz. Pelo menos é o que pregam os comerciais e outdoors mundo a fora. Quem não segue este padrão está banido do mundo moderno e globalizado, privado da felicidade e de uma vida tranquila e de paz.

É de deixar qualquer um perplexo as tecnologias criadas para o campo da estética corporal... Academias futuristas, cirurgias milagrosas, remédios extra-funcionais e, ao final, um verdadeiro desastre: pessoas lindas - de acordo com a visão de cada um, é claro - porém infinitamente infelizes e incapazes de se olhar no espelho e reconhecer o seu verdadeiro eu. Então me pergunto: porquê será que não nos basta apenas sermos da espécie humana?

Pense bem, se para ser bonito, logo feliz, é necessário ser magro, ter cabelos longos, cílios grandes, barriga durinha, seios de silicone, bíceps bem definidos (afff... são muitas exigências para ser feliz) porque será que Deus nos fez geneticamente tão diferentes? Será que queria a nossa infelicidade? Por que será que desde os primórdios da humanidade criou povos pluricelulares e cada qual com suas características?

Eu sempre questiono a necessidade de ser criar os "padrões"... Padrões de vida, padrões de construções, padrões financeiros, padrões de beleza... Na minha concepção, esse último é o mais abominável de todos. Depois de muito questionar os "padrões", cheguei a conclusão de que eles foram criados por pura falta de raciocínio lógico.

Assim como a cobra um dia falou, eu penso que quem criou os "padrões de beleza" também foi um animal, que insatisfeito com a sua vida sem paetês e silicones, e banido da classe pela idéia de querer mudar o que era, instaurou em nós, seres pensantes, a necessidade de mudar a nossa aparência. Mudar aquilo que protegia a nossa essência.

E parece que conseguiu. Estão destruindo a nossa embalagem. E fazem isto, sem que ninguém perceba que a proposta é aniquilar de vez o nosso conteúdo para que sejamos facilmente manipulados. E vão conseguir, caso não sigamos os conselhos dos outros animais: atacar a tudo que nos ameaça.

Hoje a felicidade caminha ao lado da beleza, ou melhor, atrás... Antes é preciso ser belo para depois feliz. E para ser belo atualmente é preciso mutilar-se. Arrancar um pedaço daquilo que foi feito com amor e, assim, perder muitas das características de macaco, porco, urso que por genética lhes foi deixado.

É estranho reconhecer que Deus errou! Eu não queria pensar que amanhã terei que seguir determinados padrões para parecer bela e bem apresentável aos olhos do mundo... Não! Eu não queria ter a consciência de que não me aceitam da forma como sou... De que preciso mudar para conquistar meu espaço e assim ser feliz comigo mesma.

Eu não queria ousar ter que concluir que beleza é fundamental e que caráter, integridade e respeito, são conceitos ultrapassados e perdidos em meio a tanto silicone e massas musculares.

Deus, porquê deixou um animal ter consciência e estragar a nossa consciência com padrões fúteis e desnecessários? Na verdade sei que o erro não é seu... Deste-nos o livre arbítrio e a escolha foi nossa querer ouvir e seguir esses conselhos. Bem sei que fizeste tudo certo, perfeito, e nós mentes brilhantes destruímos tudo.

Descobrimos a composição genética dos genomas para destruí-los com bisturis, injeções mágicas e lipoaspirações... Inventamos fórmulas infalíveis para prolongar a vida, porém estamos morrendo antes mesmo de imaginarmos viver essa longevidade. Ao reparar na história da humanidade, me dei conta de que sempre buscamos algo que alimentasse o ego ou que suprisse o vazio que até hoje não descobrimos qual é.

E fomos tentando... Ouro e pedras preciosas... Tapetes e obras famosas... Carros modernos e grandes construções... Até que chegamos ao silicone, plásticas faciais, etc. Tentamos no materialismo uma forma de curar nossas dores, fraquezas e limitações.

Porém fomos fundo demais. Não respeitamos os nossos próprios alertas. As sinalizações de que as coisas não iam bem. E estamos pagando caro por isso, muito caro... Mutilações irreversíveis... Depressões incuráveis... Tristezas invencíveis... Perdas irreparáveis e um vazio cada vez maior. Como se um buraco estive nos consumindo; assim como o da camada de ozônio...

Estamos nos destruindo, poluindo a nossa mente com desejos inúteis, quando o que nos completa está dentro de nós, não fora. Está na capacidade de perceber o quanto somos importantes, independente da nossa aparência. O quanto somos funcionais, ainda que não estejamos dentro do peso ideal, ainda que não tenhamos o cabelo mais bonito ou o abdômen mais sarado.

Fomos sucumbidos de nossas certezas, e hoje, o que nos resta, é o desejo de sermos o que alguém diz que precisamos ser. Contudo "precisamos" mudar isso! Retornar às origens... Retroceder, voltar a ser macaco quem sabe, reaprender...

Precisamos dar mais valor aos nossos membros e entender como eles funcionam... Precisamos lembrar dos primeiros passos, dos primeiros tombos, da primeira palavra... E assim, quem sabe, entender para quê eles servem, para quê foram criados.

Nossa funcionalidade não está diante do espelho, perdida entre os aparelhos de ginásticas e muito menos nas clínicas cirúrgicas... Nossa essência não pode ser comprada em farmácias ou em lojas de produtos naturais... Onde foi parar a nossa sensatêz? Não é possível deitar-se na cama acreditando que seu caráter foi transformado depois daquela pequena correção no queixo ou no nariz... Não é normal acreditar que a felicidade foi reconquistada depois de uma lipoaspiração...

É difícil perceber, mas somos muito mais do que a nossa aparência nos mostra. Não acredita? Experimente desaparecer por alguns dias... Ficar sem dar notícias a familiares e amigos... Durante esse tempo seus “defeitos físicos” não farão a menor diferença para aqueles que realmente se importam com você. Para aqueles que te veem com olhos interiores. Aqueles olhos que não se podem comprar ou não estão ocultos por lentes de contato.

Isso! Suma, desapareça e leve com você apenas uma certeza: alguém sentirá sua falta e irá ao seu encontro. Quando isso acontecer, pergunte-os o porquê foram te buscar... Na ocasião, aponte seus defeitos físicos e espere pela resposta.

Talvez se fizéssemos isso, teríamos a consciência de que a nossa aparência é um mero detalhe diante do que somos uns para os outros e das maravilhas que somos capazes de realizar, cada qual com as suas diferenças e limitações.



Quando pensarmos assim, seremos capazes de entender o porquê do corpo morrer e apodrecer e o espírito permanecer vivo e eterno.


A verdadeira beleza é interior.





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